De quem é a culpa?

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

PONTO SUPRA-EXTERNO (de Marcos Salvatore)


 I

Baby, me ouça contar tudo
Estou com isso preso na garganta,
Como um pomo-de-dão
Me soletrando as sílabas

Senta aí, depois cala essa boca

II

O proveito da terra
É a serventia do pão
E eu me pareço com meus erros
Toda vez que deixo passar meu coração de mão em mão

Preciso de um porre que coincida com a perda de tudo
Com a falta de vergonha na cara até de chão pra me jogar
Não existe palavrão que não tenha sido dito - isso eu posso assegurar
Brincadeira tem hora certa de parar e a gente estaca

Um em frente ao outro
Respondendo, reagindo, atacando

É difícil acreditar em tudo
Depois descobrir que nada é importante
As pessoas se contentam em seguir adiante
Depois do sinal verde, irrelevante

III

Está tudo em cima
O cigarro, o lugar e o vinho
Uma mesa de vidro suja
Em cima o perfume que você usa.

Que seja assim para lembrar

Toda noite eu te procuro e te envolvo
Me sento, me finjo de morto
Me ponho em seu colo e choro

Eu te agarro, e te levo pro bar.
Depois te deixo com a conta pra pagar

Foi você quem quis assim - eu te avisei
Assim não há ninguém que aguarde
O meu amor é assim, se deixa levar.

Mas sou teu amigo sem cobrar
Esse lance de idade suja a barra pesada
Do que eu sinto por você
As tuas coisas, os teus peitos, a tua boca

Só me dão prazer quando eu cobro
Você é a mulher do meu mundo evanescente

IV

Porque o dia nasceu,
Tem mais gente nas ruas,
Alguns em cima da hora,
Outros dando em cima de alguém.

De que vale a sensação de coisa inteira?
Deve ser pra se fechar, se ignorar
Ou então pra terminar o que se começou.
Pra se abraçar ao beijo que ainda não rolou.

V

Talvez você já desconfie
Mais ou menos como uma letra ou quatro
Que sempre cabem num melhor lugar
Bem felizes por mostrar o que se sente

Estou complicando demais, pode crer
O que eu tenho pra dizer é bem mais simples
Não é difícil de se ver, mas de dizer
É um sentimento bonito, arborizado como um bairro antigo

Mas quer saber de uma?
É melhor não dizer nada.
É preciso viver o gosto.
É preciso viver.

2 comentários:

  1. Isso tem um ano. Escrevi enquanto esperava pela van. Duas, três da manhã. Um casal discutia relação, um tiozinho bebia café na tiazinha do completo, dois policiais jogavam cartas e eu curtia um porre elementar. Gostei do resultado. Não é linear, nem objetivo. Mas me faz voltar no tempo, o que é uma merda.

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