De quem é a culpa?

segunda-feira, 26 de março de 2012

TINTA (de Marcos Salvatore)


by Van Gogh

Não dá mais pra repartir
O que eu não sei te dar
Nem me abandonar com você
Da mesma altura

É só o tempo de me despedir
Não posso mais ficar te acumulando
Nem esperar que a tinta seque
A despedida de tantas palavras

Não dá nem pra reprisar
A preta e branca ou colorida
Pose das fotos caladas na parede

Só sei nadar fugindo da rede
Na contramão do rio
Aqui fora as portas não têm chave mestra
Ainda arrombo uma por uma

Em busca de amor, pena e papel


quarta-feira, 14 de março de 2012

RETIRO GRANDE (de Marcos Salvatore)

by Helmut Newton



A cerveja acabou.
... e antes de cortar a garganta dele, foi até a mercearia da esquina e comprou uma garrafa de vinho das trevas, esmalte de unha, algodão, agulha e linha. Na prateleira havia macarrão instantâneo, sabor de galinha caipira. Comprou.
Precisava de coragem e... cuidado, para não acordar os vizinhos com o barulho do serrote. A fumaça também seria um problema.
Quando entrou em casa ele ainda estava caído sobre o chão da cozinha, inconsciente e amarrado. Abaixou-se para verificar se já estava morto pelo golpe do martelo em sua nuca. Sentiu seu ânus sangrar um pouco, e a dor e o cheiro de bebida e urina a fizeram se lembrar do estupro da noite anterior e... das passadas.
Masturbou-se uma última vez com o cabo de sua escova de cabelo enquanto olhava para ele... [olhava para ele]... {olhava para ele}...
Por fim.... afiou a faca de churrasco (passada de mãe para filha) na antiga pedra de amolar da cozinha. Suas conjecturas pareciam não ter fim à cerca da cegueira de seu ferido ódio, filho bastardo da mutilação de seu amor. Sabia das consequências.
Uma última vez para uma última lágrima. Mesmo assim, virou para ele e disse:
- Já ouviu falar em combustão instantânea? (...) Não vai ser o nosso caso.