De quem é a culpa?

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

MÉNAGE ATROZ (de Marcos Salvatore)

"Ménage à trois", de Hernan Bas


Não vou perder tempo com detalhes inacabados. Não saberia falar deles, por isso, vou direto ao último capítulo.
“A escolha foi sua. Só queria te poupar”
Depois de meses de sexo alternativo, marcamos um encontro decisivo. A tão esperada noite. Antigamente a gente só vivia uma vez.
“O amor é puro entusiasmo e raiz”.
Ela me fez valorizar e saborear os lábios vaginais de cada pétala não desabrochada de sua flor. Sua crueldade sodomita em me cultivar com promessas, me aniquilava... me nutria.
“Deriva do ópio o que sinto quando te ouço dizer, distraída: - “Não””.
E o tempo aumentou minha obsessão por seu amor, também fez o que devia: apenas deixou-se passar, como um sinal da cruz.
“Resumo: minha loucura sou eu”.
Um dia fomos surpreendidos em casa, descobertos, confrontados, mas negamos, foi o que fizemos, sim. Negamos.
“Fizemos coisas questionáveis”.
Uma barata voadora interrompeu nossa tensão para pousar dentro da xícara de café, mas não morreu imediatamente, parecia nadar naquele morno suicídio involuntário. Ela então toma coragem emprestada do seu hímen intocado e o desafia.
“Sociedade anônima do tato”.
Ainda intacta, se ofereceu para um reconhecimento: noivo e amante presentes e ativos – uma arma dava a ele garantia de êxito: a ordem dos membros não altera o orgasmo, mas nesse caso alteraria.
“Inocentes, até que se sangre ao contrário”.
Uma vez assisti a um filme em que um morto-vivo, antes de devorar o cérebro de uma velhinha, disse: - “Dói estar morto”.
“Por favor, não me machuque agora”.
Empatamos, pois também acho que às vezes dói estar vivo – valeria mais que a inusitada lua que ri e chora seus minguantes e crescentes.
“Mato os dois, agora, e pego o que deveria ser meu”.
E bem na minha frente deflorou a futura esposa apressadamente. E enquanto a penetrava apontava a arma para mim.
“Não me importo, mas me culpo por não te culpar”.
Desvirginada pelo futuro marido, não o amante, a este dedicou as ancas. Seus olhos se abriam... fechavam... se abriam...
“Vem, que o único armado é você, meu amor”.
Se sentia inocente por amar aos dois. Entendeu ali seu futuro.
“Não sei me atrever, mas me atrevo, não o quanto”.
Assim: Tríplice colheita pagã - Duvido essa teia ao arranhar dois céus. Duvido que tece essa fonte. Duvido que tece. Duvido sua flor ao invadir seu portão dividido.
Foi tudo tão... feio.
“Mas sigo vivo”.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Matilde nº 02 (de Marcos Salvatore)


Boa noite, Matilde
Obrigado pela altitude
Nosso ascendente é igual, é vadio
Se completam, se lançam, se não

Um cão late lá fora, real
concepcional injetável
nos perdoa o crime
Só o creme latir, gritar, rosnar, sibiliar

Aprecio o seu silêncio
Matilde
Esta noite, tava por aí
Estava aqui pensando...

Não sei explicar,
Talvez nem queira
Realmente a gente taí
Gosto da sua companhia.

Me faz sentir melhor...
Eu acho, eu sabia
Billie Holiday me deixa inexpressivo, você
Tão desmascarado, cara amarrada

Meu pau quer ser amigo
Quer te ouvir falar em seu ouvido

Descolei um lugar só pra nós
Nas internas, na boa
Pra gente se gravar num corpo a corpo
Acenando pro tempo passar

Disco voador depois da chuva sem lua
Ando escrevendo um monte de bobagens...
Poemas e histórias legalmente inadimplentes
Verdadeiras infelizes.

Estou exumando meus mortos,
Ultimamente é inevitável,
Acontece o tempo todo
Você faz.

Quem sabe um louco?

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Restos do Naufrágio (de Marcos Salvatore)



Todos os deuses não podem nos salvar
E, assim, caminhamos a esmo
Esbarrando em paredes de vidro ou concreto
Em avançado estado de recomposição

Não dizemos nada
E só.
Basta!
É fato.

Vemos fotos de desastres todos os dias.

Os amantes se suicidam e julgam um mundo
Sem julgar o fato.
Sempre o fato
E eu me pergunto:

- vale a pena dizer “você pode ser amada por mim”?
Vai despedaçar meu coração, na próxima esquina?

Se deixar eu juro que não estarei armado,
Nem tatuarei seu nome no meu braço.

Criado Mudo nº 08 (de Marcos Salvatore)

Sou incapaz de não exergar a beleza.
Vivo numa cidade que me habita por inteiro.
E a medida do amor é, isoladamente ou em conjunto, equivalente ao que sabemos ter para dar e receber; nem um cigarro a mais, nem um cigarro a menos.

E é preciso aproveitar o tempo antes que ele se aproveite de nós.

E é tarde "paca", meu velho.
Já roubamos, já matamos.
Nos perdemos.
Mas se perder é perda de tempo.

O falso testemunho é perdoado por antecipação.
E a cobiça te espera,
Ela está lá, entre a privada e o chuveiro,
Pronta para te ferrar,
Como um escorpião, cauteloso dono
Da cozinha, do quarto, da sala e do banheiro.

ÍMPAR (de Marcos Salvatore)

by Sara Saudkova

Ando envolvido
Estou a par

E sei
Que tudo que ela fez pra conquistar meu coração
Captura

Lama Curativa (de Marcos Salvatore)

Na esquina tem o sol desta manhã
Enquanto o percurso diário se imita
Busco no dia um motivo que me deixe exausto
Pra dormir afinal
Eu faço as contas e os motivos brigam entre si
Justificam-se aos tapas
Suicídio é viver
Sujando a cama de lama curativa
Vontade de cumprimentar alguém na rua quando saio
Passo por todos, olho para os rostos
Agora que estou sozinho
Posso te amar melhor, você
Que me confundiu com seu destino
Mas quando volto tem a lua
E no caminho tem a casa
Aquela que um dia foi minha, foi sua.

Lama Curativa (de Marcos Salvatore)

Na esquina tem o sol desta manhã
Enquanto o percurso diário se imita
Busco no dia um motivo que me deixe exausto
Pra dormir afinal
Eu faço as contas e os motivos brigam entre si
Justificam-se aos tapas
Suicídio é viver
Sujando a cama de lama curativa
Vontade de cumprimentar alguém na rua quando saio
Passo por todos, olho para os rostos
Agora que estou sozinho
Posso te amar melhor, você
Que me confundiu com seu destino
Mas quando volto tem a lua
E no caminho tem a casa
Aquela que um dia foi minha, foi sua.

Meiga, a Esquerdinha I (de Marcos salvatore)

Trilha Sonora: Reggae engajado.

Conheci Meiguinha no Carnaval de 1994: num forrozinho universitário muito do pé-de-chinelo - não vou entrar em detalhes. Queria apenas dizer que aquela "coisinha do Pai", tímida, discretíssima, aprendiz de Carola, iria se tornar (com o tempo) a mulher da minha vida - e, é claro, tesourar, marcando em cima, o meu lado rock'n'roll.
- Como é, Princesa? Vai liberar, ou não vai? Me diz.
- Você só pensa em sexo: o Plano Real ainda nem deu o recado e você, aí, pensando só no seu pauzinho.
- Porra, Meiga! Sermão tem hora certa, criatura. E eu não penso só o em mim coisa nenhuma. Você "Bete Balança" e ainda fica com o líquido, porra!
- Cafajeste. Me dá! Devolve a minha apostila do Kant!
- Então me dá um beijo. Um beijo não, dois: uma na boca - e de língua, que eu não sou otário -, e outro na cabeça da minha pomba. Depois eu quero ket, ket, ket!
- Então tá, só isso? Que bicho-de-sete cabeças. Me dá aqui que eu faço até mais.
- Falou! Tá, mas não esquece da linguine, tem que ter linguine, minha filha. (...) Espera, espera. (...) Está me olhando assim, por quê? (...) Solta, Meiga, eheheh. Qualé? (...) Escuta, olha: Eu te levo, te levo no "Se rasgue", ou sei lá. (...) Para, Meiga. Porra! SOLTA A CABEÇA DO MEU PAU, CARÁI!!!!!!!!

CONTINUA...

Anorexa, Tu! - 4ª Parte (de Marcos Salvatore)


O TELÉGRAFO
Um brinde esnobe. Olho em torno. Sinto-me estranhamente protegido por esses personagens tão desconhecidos quanto dessemelhantes. Que lugar! O que eu fazia ali? O que fizemos lá? Para onde? Vinte e uma horas e a cidade está vazia... assim como eu. Minto. Eis a verdade: a alegria otimiza menos a fome: além do leite vem a energia. A luz da cidade apaga as estrelas com seu despudor, sua depravação. E depois de algum tempo sem ser notado, você passa a não notar mais ninguém. Boa noite, dependência.
Duas quadras depois, exaustos de tanto correr (aqueles tamancos não ajudavam), dobram na passagem Brasília e se deparam com um beco sem saída.
Quinze anos de experiência investigativa diária dera a Wanderley uma espécie de pragmatismo emotivo, uma lucidez passional ao mesmo tempo derivada e original. Era uma pessoa que a tudo compreendia com um sorriso sincero e pleno. Era da opinião de que existia um motivo para tudo. Nunca deixara nenhum caso sem solução. Conhecia a cidade em que estava como a palma da mão e tinha informantes nos lugares mais inóspitos e perigosos.
- Meus caros, chega a hora de estabelecermos as prioridades: estamos sem carro, estamos em seis, vestidos de mulher e sendo perseguidos por um bairro inteiro. O que sugerem?
- Temos uma arma... – Castro diz isso levantando a saia e mostrando o revolver preso à sua cinta liga: - Ainda restam quatro balas no pente.
Vila, que ficou calado durante toda a perseguição, arranca sua peruca e a joga no chão; tira os cílios postiços e nota que lhe falta alguma coisa:
- Preciso de um cigarro. Um cigarro, por favor. Pra pensar preciso dar um trago, um trago só.
- Só tenho um – diz Sávio, contemplativo: - vamos rachar, só quero um vinte.
Estavam sob a luminária falha de um velho poste, em frente a uma venda de açaí. Fumam em silêncio até que a misteriosa garota da boate se levanta languidamente e pergunta para Sávio, numa espécie de angústia (...) mas antes dela falar, preciso dizer que ela era linda! Linda! Uma Panicat do michê, com melhores modos, porém (Paquita, não!):
- Então... você não foi lá por minha causa?
- Sinto muito, não me lembro de você, não me lembro de nada. Estou sob custódia da polícia, provavelmente até o final da noite estarei preso por assassinato ou pior: morto... e nem ao menos sei o porquê. Me desculpe.
- Mas, como aconteceu?
- O que eu prometi a você? Qual o seu nome?
- Se você não se lembra, não importa mais.
Aloísio explica, em poucas palavras, tudo que acontecera desde que o flagraram fugindo do local do crime.
- Nos encontramos outra noite. Umas semanas atrás. Na verdade não foi bem um encontro. Não tive clientes e no final da noite ele apareceu. Ficamos juntos e eu gostei dele. Parecia tão sincero e foi tudo tão... verdadeiro. A pessoa mais amorosa, mais carinhosa... foi a primeira vez que alguém me tratou como uma mulher.
Castro se aproxima e pergunta sobre o que conversaram. Quem sabe alguma informação poderia esclarecer a presença do rapaz numa cena de homicídio.
- Contei a ele do meu sonho mais profundo, mais secreto. Ele prometeu que voltaria um dia e me levaria para ver o mar. O mar.
- Está nos dizendo que alguém que você jamais vira, promete lhe levar numa praia? E uma puta acreditou nisso?
- E porque não? A vida é tão curta, não é? Ou não é? (...) Esperei por ele todas essas noites e quando o reencontro me aparecesse com policiais e sendo perseguido.
Wanderley, impressionado, delibera: - “Puta, não: Meretriz. Meretriz! Mas isso é outra história, Professor Castro. Todos são inocentes até que se prove o contrário. Não sabemos quem você era ou foi. Tudo que sabemos é que temos um corpo estirado numa cama, num quarto motel vagabundo e que o Sávio aqui, é a única pessoa que sabe da verdade”.
- Com essas roupas não vamos longe – diz Aloísio para Wanderley: - Ô, Mano, você não conhece algum lugar pra tirarmos estas roupas e pegarmos um carro?
- A Seccional do Telégrafo, mas é o primeiro lugar que vão cercar. Não temos passagem.
- Eu tenho uma idéia: O Cacareco.
- O que é isso?
- É um bloco de Carnaval.
- Mas não estamos no Carnaval.
- Eu sei. Mas hoje tem festa Dark por lá. Entramos por trás, tem os banheiros, pelos quintais da passagem União e roubamos as roupas de alguém. Estão procurando por travestidos.
- Então vamos lá.
O CACARECO

Saindo da Brasília, vêem uma senhora na janela, pequenina, moreninha. Pedem um pouco d’água. Ela entra, anda com ajuda de uma muletinha. Trás a garrafa e um copo que é dividido por todos. Olha para suas roupas, maquiagem e sorrí como uma mãe para todos: - “Guenta! Tem doido pra tudo. Desconjuro!”.
Caminham pela curta passagem União tentando fazer todo possível para não chamar a atenção. Wanderley sabia que batalhas de gangues aconteciam muito por ali, por isso o deserto e o silêncio da rua. Porém, já era tarde. Na esquina da passagem Santa Cruz um grupo de pelo menos dez suspeitos os esperavam.
- E agora? Não dá mais pra voltar.
- Vamos passar por eles, então.
- Por mim tudo bem. Quatro balas resolvem.
- Também estão armados.
- Eu não tô nem lá. Cansei de passear. Tá na hora da diversão.
Se aproximam e o líder a gangue dá um passo à frente e diz:
- Vocês devem ser aquele bando de bichas que fugiram do NAIPE, não é? Não quero problemas com vocês. Só queremos esses dois, aí – aponta para Sávio e a garota. Eles valem mais vivos do que mortos. E somos oito contra seis.
Wanderley se aproxima do líder e faz uma proposta irrecusável:
- Tenho uma idéia melhor. Vamos brigar apenas nós dois e quem ficar de pé se manda com tudo, inclusive as armas. Cada um pega o seu rumo.
- Por quê se eu posso erguer a mão e matar todos vocês de uma vez?
- Porque um líder de gangue que recusa um desafio não é considerado. E eu te desafio na frente de todos os teus. Aqui e agora. Como é? É covarde?
- Velhote! Eu vou te surrar tanto que vão dizer que eu te bati com uma tábua.
Wanderley entrega seus pertences para Sávio: - Segura garoto, que faz tempo que eu não pego um palhaço desses.
Todos abrem espaço e a briga começa. Wanderley leva os três primeiros socos apenas para medir a força do oponente. Cai no chão uma, duas, três, quatro vezes. Por entre risadas seu rosto sangra enquanto todos se contém a seu pedido. A cada soco Wanderley ri cada vez mais e mais alto. Sua idéia era chegar perto o bastante para dar um único golpe.
- Para de rir! Para de rir!
É nesse momento que seu adversário se aproxima o suficiente pra levar um quebra-perna de Wanderley, caindo em seguida aos berros.
Wanderley o segura pela camiseta e o arrasta até a vala mais próxima; diz:
- Meu rapaz. Posso quebrar a outra perna ou te fazer beber água da vala. Qual vai ser?
- Vai te foder!
- Boa escolha. Você é quem sabe. Vai comer merda agora.
Com destreza, enfia a cara do bandido na vala várias vezes, quase o afogando. Chega perto de Sávio e se lembra: - Porra, esse vestido até que é do caralho.
Depois de pegar a rua sem maiores problemas, atravessam os quintais de terrenos baldios e chegam finalmente na entrada de trás do Cacareco. O Pink Floyd Cover fazia um dos seus melhores shows.
- Parece um velório em preto e branco.
- Pelo menos não é um show de aparelhagem.
- Merda! O jogo já deve estar no segundo tempo.
Roubaram as roupas de quem apareceu pra mijar.
- Vamos tomar pelo menos uma antes de ir embora. Só pra ver se cola.
Enquanto tomavam seu drink, não sabiam que uma figura de óculos escuros e aparente interesse em todos se aproximava.
O OBSERVADOR

- Boa noite, senhores. Vejo que trocaram de roupa. Essa está melhor.
- Quem é você? – pergunta Castro, segurando de leve em sua arma.
- Sou um Observador. Chancei, ao seu dispor. Estou aqui para ajudar e trazer notícias dos outros.
- Que outros?
- Do delegado e do advogado. Eles chegaram bem e estão interrogando o padre nesse momento. Estão na Igreja das Novenas. O garoto já lembrou?
- Não. Ainda não.
- Já sei o que houve na Santa Cruz. Foi uma boa briga. Boa briga.
- Precisamos de um carro pra sair daqui.
- Daqui à pouco passa o último Icoaraci. Perto do Curro Velho. Se o pegarem podem descer na Praça do relógio em pouco tempo.
- E você?
- Eu não vou. Eu fico. Não tenho nada com isso. – vira-se para o garoto e diz: - E lembrem-se: talvez a chave de tudo não seja o garoto afinal. Posso distrair quem estiver esperando por vocês lá fora enquanto todos correm. Nos vemos depois da festa.
Quando saem, percebem que o lugar realmente está repleto de figuras mal encaradas.
- No meu sinal vocês correm em direção da Pedro Álvares.
Chancei então puxa duas armas e começa atirar em todas as luminárias dos postes, depois os pneus dos carros. Dá o sinal e todos correm para o semáforo. Acontece que na encruzilhada outros raptores os esperavam para uma armadilha. Pularam um muro que dava pra uma casa fechada. Casa esquisita, sem fachada, nem janelas, apenas vitrôs. Entram todos pela cozinha e bloqueiam a entrada com a geladeira e o fogão. Sobem uma escada giratória estreitíssima até um minúsculo terraço de onde puderam ver o tamanho da encrenca em que se meteram: de todos os lados da Arthur Bernardes e da Pedro Álvares Cabral, armas apontavam para cima. Começa então um tiroteio que acaba com toda a munição.
- Estou vendo o ônibus. Está chegando perto.
- Então vamos ter que pular.
Preciso falar um pouco do sargento Vila: era um homem sem medos, porém nada o assustava ou confundia mais do que grandes alturas. Por vezes, da janela do seu apartamento (janelas com grades) olhava para baixo e pensava: - “E se eu pulasse e saísse voando? Não cairia nunca. Nunca!”. Estou exagerando, desculpem, mas quem não se pergunta isso? O certo é que seu território sempre fora o chão. Então aquela situação parecia decisiva: pular ou não pular para ele lhe tirava o fôlego só em pensar. Mesmo assim, antes da hipótese suicida de pular surgir, pensou: - “Um pôr-do-sol daqui deve ser do caralho!”.
- Ele parou! Parou! Se corrermos e nos jogarmos no teto do ônibus estaremos salvos.
Aloysio toma distância e se joga, caindo em seguida com segurança em cima do teto do ônibus que estava bem perto deles. Wanderley, Sávio e a garota o seguem sem problemas. Ao perceber a jogada, os bandidos embaixo começam a atirar. Castro vira para Vila sôfrego;
- Pula, porra!
- Não posso, não consigo!
- Então ficamos aqui, os dois. Não vou te deixar aqui pra morrer, seu cagão!
Vila fecha os olhos, toma distância e antes de se jogar tropeça e fica preso pela jaqueta entre o ônibus e um ferro solto no vitrô, do segundo andar.
- Espere não se mexa, só mais um pouco. Ainda tenho dois tiros. Prometi usar todas essas balas hoje.
Castro então mira com sua Magnum 44 e atira, soltando o amigo. Pula em seguida, pouco antes do motorista, desesperado pisar fundo, quase jogando-os de cima do ônibus.
- Estão todos bem? Todos bem?
- Não, acho que vamos ter que dar uma parada.
- O que houve?
Sávio sorri nervoso antes de virar para todos e mostrar o sangue no peito.
- Puta merda.
Aloisio passa a mão pela cabeça. Todos se entreolham enquanto o rapaz é agarrado pela garota em prantos. Dois carros os perseguem.
- Ele está sangrando muito!
Ônibus em disparada já estava indo para a garagem depois da última volta. Castro se arrasta até abertura da porta superior e consegue entrar. Aproxima-se do motorista e grita:
- Pare esse veículo que eu vou descer. Essa merda já foi longe demais. Longe demais.
- O que ele vai fazer?
Castro desce e o ônibus segue. Espera pelo melhor momento e dá um tiro certeiro que faz um carro capotar por cima do outro. Um dos bandidos se arrasta atirando e acerta Castro na perna, outro também se recupera e se levanta, aponta a arma para Castro que, indefeso, balbucia: - “Então, é isso!!”. Não vê o ônibus dirigido por Aloisio na contramão, a toda velocidade se aproximando.
O impacto da batida foi tão grande que o bandido foi parar a metros de distância.
- Carona, filhão?
- hehe! Tu sabes.


Na Igreja, depois de ouvir a confissão do padre, o telefone de Seu Iraque, digo, Eráclito, recebe uma chamada a cobrar:
- Que foi, porra? Telefone público? Por que estão demorando tanto? (...) Sei, dois feridos. E o motorista do ônibus? Ok, em segurança. (...) Precisam descer na Dona Roxita pra fazer curativos. É puta velha, vai resolver tudo. (...) Minha mulher já me ligou escroteando. (...) Porra, Wanderley, na minha ausência o comando é teu, cacete. Quero vocês aqui antes do final do jogo. (...) Tá 2X2. Caso sério. O Bocage já tá virando do avesso. E o garoto? (...) Escuta.. escuta... só me ouve. Tem uma garota com vocês, não tem? Isso mesmo. O nome dela é Lucrécia. Lucrécia, ouviu? O padre confessou tudo. Ela é a culpada, Wanderley, a culpada pela amnésia do garoto.

CONTINUA...

Anorexa, Tu! - 3ª Parte (de Marcos Salvatore)


by Helmut Newton



Eu matei. Sim, talvez eu tenha: eu, assassino do que sinto falta. Surpreendo-me com a naturalidade com que me deixo esquecer. Fecho os olhos e ainda vejo, distante, brilhante sobre um fundo preto, o rosto de uma mulher. Lembro-me de amar quando amado, de odiar quando odiado. E cada minuto tem uma profundidade imprevisível, irresponsável. Sou um engodo inusitado, uma isca do mirante do Forte até aqui. Só esqueço de perguntar pelo seu nome, o nome dela.

DEMÉTRIO: O POODLE Nº 0

Os carros pararam em esquinas distantes: Vila, Castro, Aloísio e Sávio. Aguinaldo e Wanderley já estavam a caminho. Seu Iraque, digo, Eráclito; Bocage e dona Aldenora no banco de trás na maior farra riam até de sinal fechado:
- Minha pombinha, dá uma emboladinha aqui, isso devagar com os dentes senão eu não me concentro na materialidade da ocorrência. Cuidado que esse caso é de grande jurisprudência.
- Ai, só gosto de homem que fala difícil. Homens de substância.
Era verdade. Dona Aldenora sentia um atração inominável, desde pequena, menina que subia de saia sem calcinha no açaizeiro, por homens que falavam alto, mais velhos, desembaraçados. Bocage a conheceu durante uma de suas palestras: lá estava ela com seu caderninho de anotações e a cada termo jurídico Bocage percebia que aquela morena de peitos fartos e quadris de “aluna em recuperação” se torcia e retorcia em mil e uma danações. Depois de muitos “datavenias” e “deveras”, soube que tinha encontrado a assistente perfeita para as horas extras.
- Seus imorais. (...) Se a dica do garoto estiver certa, nosso elemento deve estar até o pescoço envolvido com o corpo estirado lá naquela cama – “Oito horas: já vi que vou dormir de novo no sofá”.
- Se Vossa Senhoria me permite, chegando lá, peçamos uma garrafa do melhor whisky e um balde de Red Bull que as Plocs vão “cair matando”.
Entram disfarçados numa boate aparentemente normal, não fosse por um corredor estreito com um poodle minúsculo de guarda.
Aloísio com seu chapéu dos intocáveis (versão em preto e branco) tenta fazer festinha no canino, mas o mutante fica em duas pernas e se transforma num gremlin feroz, botando todos pra pular uns por cima dos outros. Bocage, vestido de motorista de caminhão, acha uma graça infinita e chama dona Aldenora, que estava vestida de mulher que finge que é homem, que finge que é travesti, que finge que é Violeta Parra, para apaziguar a fera.
- Vem cá, bonitinho, não liga pra esses mauzinhos.
Passam todos: Vila de sandálias havaianas, bermudão e camiseta do Iron Maiden e Castro de hare krishna Prêt-à-porter, que antes de entrar dá um chutão no Nº 0: - Por quê essa pavulagem com cachorro? Está quase dando de mamar pra esse pulguento.
O delegado que estava vestido de ator pornô dos anos 70, olha por cima dos óculos ray ban e pergunta para Bocage:
- Ô Bocage, tu ainda tem desconto nesse antro?
- Mas é claro, camarada: cinquenta por cento. Quer ver só? – para o “leão-de-chácara” da entrada: - Nossa amizade, eu sou amigo do fulano de tal, que é dono daqui e gostaria de um abatimento nas entradas, meu nome é Doutor Bocage, mas pode dizer que aqui é o Sabá.
- Por quê Sabá? – pergunta Aloísio, coçando o cavanhaque – Puta nome tosco, anárquico-carnavalesco.
- Ganhei esse apelido quando frequentava o “Nas Coxas”. Só ia no sábado, nada demais. Minha reputação me precede.
O funcionário entra e volta no mesmo instante com uma voz nasalada que deu o que pensar:
- O patrão falou que fiado só amanhã.
Depois de muita conversa vencida há uma coleta e todos entram. Castro ainda pergunta se aceitam Meia Entrada, mas leva um puxão de braço de Vila que a tudo desconfiava no lugar.
E que lugar: padres, freiras, pastores, rabinos, bicheiros, reitores, funcionários públicos, políticos de todas as raças negociando o amor de meninas e meninos de no máximo 17 anos. O maior circo de parafilias nervosas (e influentes) já visto. Puro Ensino Médio em flor, das melhores famílias e escolas da cidade. A surpresa de todos foi tanta, que Seu Iraque, digo, Eráclito, conclui severo: - “Essa é a verdadeira “Corda do Círio”, o resto é piada. O verdadeiro significado das ações... é o significado das ações”.
Desconcertado, Vila pensa: - “Será que vai dar tempo de pegar o segundo tempo do jogo? Aposto que a idéia do plebiscito saiu de um buraco como esse”.
Bocage, lúdico: - “E pensar que é assim que se constrói um país. É por isso que o perdão custa caro: pra financiar o pecado”.
Castro faz as contas e resume para todos: - “Se esse é o Nível Médio, como será o Superior?”.
- Provavelmente mais caro – diz Aloysio que até desliga o celular para ver e ouvir melhor aquela cena grotesca de puro Satyricon. Satyricon não: Sallon Kitty. Dona Aldenora começa a sentir uma coisa, uma coisa.

DZI BIGODES

- Vamos nos espalhar – diz Seu Iraque, digo, Eráclito, cauteloso. Já sabem a quem procuramos. Agora, só tem uma coisa, hein? Se eu pegar alguém de relaxação, vai pro xilindró. Vila, cuida do garoto. Vê se ele lembra de mais alguma coisa.
- Sávio, o que você fazia aqui?
- Procurava por alguém, eu acho.
- Acha? É melhor ter logo certeza de algo, senão, eu acho que vou te largar uns cascudos. Lugarzinho estranho esse, não é? Cadê o sujeito? Cadê o velho que levou a menina?
Um pastor, desses de gelatina milagrosa, brincava de cavalinho com uma ninfetinha de no máximo quinze aninhos, que o chicoteava nas nádegas, dizia: “Opera, minha filha, opera”.
Bocage, aproveitando a oportunidade de tantas autoridades juntas sai distribuindo seus cartões, enxerga de longe o procurado. No palco, o caçado: um padre - ou seria abade? - dançava chupando um picolé de taperebá, agarrado a um índio de vestido cor de rosa e tênis futsal.
É impressionante como a concorrência para catequização de pagãos ainda está na moda. Todos os caminhos levam a Roma, não é “vero”?
- Isso, isso, isso! Vai lá, Pai.
Aloísio tranca a porta, enquanto Castro saca sua Magnum 44 e dá dois tiros numa caixa de som – “Porra, de tecnobrega!”.
- Epa, epa! Que é isso? Que é isso?
O delegado sobe numa mesa e comunica:
- Seus depravados! “Vamo” acabar com essa cornada, porra! (...) Calma, minha senhora, pode continuar com o seu boquete. Nosso assunto é com um único “pó de broca”: aquele ali. Queira se apresentar, por favor. (...) A sua “bença” padre, sabe que o senhor é mais simpático ao vivo que na TV?
O eclesiástico toca de leve os dedos do delegado e diz, afetadíssimo: - “Barazer, Abatezza Zibody. Hoje é beu dia de folda”.
- Ih, mais essa, agora: o velho é tatibitate, “homem-rapaz”! Que marmota é essa? Vamos precisar de tradutor. Tenho uma missa pro senhor rezar. (...) Vila, tá na hora do confessor se confessar. Pode levar. (...) Porra, Castro, eu disse pra não trazer arma nenhuma, cacete!
- Tá aqui no cu deles que eu vinha pra cá desarmado.
Um brutamontes da segurança pega no ombro de Vila e diz:
- Perdeu, perdeu!
Vila calmamente olha para aquela mão em seu ombro e nota que sua camiseta do IRON MAIDEN amassou um pouco:
- Eu perdi e tu achou. Toma o do Natal!
Vila dá um murro que quebra o nariz do segurança e a porrada geral começa bem na hora que Aguinaldo e Wanderley aparecem segurando o poodle nº 0. Wanderley, vestido de Cowboy Fora da Lei, dá o comando: - “Pega Demétrio, pega”!
A gremlin avança em todas as bundas. Aguinaldo, que estava vestido de punk, derruba logo uns três, virando uma mesa cheia de pênis e xoxotas de plástico, sopa de merda e suco de mijo e vômito, pro banho romano – verdadeiro bufê parafilítico.
Como muita gente ali estava amarrada por gostar de bondage, acabaram levando umas lambadas também. Meninas (Duca! Duca!) que vestiam seus uniformes (com os pais presentes), na pressa de correr do flagrante, esqueciam seus cadernos e carteirinhas de meia-passagem.
Peço aos leitores para imaginarem, em câmera lenta, o caso de amor à primeira vista entre o investigador Wanderley e o sistema de som dolby sunrround do recinto que foi possuído por ele ali mesmo, na frente de todos.
No meio de tudo, além do som das cadeiras e mesas se quebrando, além dos latidos assassinos do cachorro, era possível ouvir claramente a risada de Bocage e dona Aldenora dando umazinha atrás da cortina. Todo mundo aproveitando pra tirar umas casquinhas. Putaria, sacanagem e violência. A moçada do “arroz com mel” (enemas) tentava inutilmente correr com aquela coisa enfiada na bunda.
Quando tentaram sair, outros seguranças aparecem no corredor. A porta é trancada e eles ficam sem saída. É quando Sávio puxa o delegado e dá a solução:
- Tem uma porta atrás daquele quarto que vai dar num outro quarto que vai dar nos camarins da boate.
- No, no. Então é isso mesmo. Por aqui, todo mundo.
Antes de sair pela fuga, Castro ainda volta pra chamar todo mundo de bunda mole:
- Seus “gala seca”, bando de frouxos. Agora eu me invoquei, chega todo mundo que eu meto é bala!
É puxado pela camisa por Aloísio e Vila enquanto Wanderley calmamente termina o seu drink, curtindo um som do Uriah Heep que acabara de colocar no volume máximo.
- “Bora”, porra, que a gente roubou umas garrafas de whisky tantos anos.
- A “Abadessa”, protestava: - “Calba, calba! Bor vavor, zim, Bem? Dão be gombrometa. Bor vavor, Negron!”.
- Essa égua tá falando que nem apresentador de telejornal empolgado. Arrasta!
No camarim a única saída era pelo palco e o único jeito de saírem sem ser reconhecidos era o de se travestir e sair dançando (o padre gostou).
E foi isso, quando “Relance”, da Gal Costa começou a tocar, aquelas figuras andróginas deram um show tão bacana que duas mocinhas chamadas Ivone e Marta, invadiram o palco enlouquecidas para agarrar os dançarinos. O jeito foi leva-las com eles.
Antes de correrem para os carros, Sávio teve a impressão de ter visto alguém. Alguém que não poderia estar vivo. É repentinamente tocado no ombro por uma mulher, alguém que parecia reconhecê-lo:
- Veio cumprir seu juramento?
- O quê?
- Não se lembra mais de mim? (...) Talvez disso você lembre.
Agarra-o pelos cabelos e lhe dá um beijo apaixonado, sem fim; depois morde seu lábio inferior até sair sangue. Diz sorrindo, com uma tristeza terna, doce:
- Me leva com você.
- Então vem.
Aloísio acha muito louco, e puxa os dois pra dentro do carro, para junto dos outros. O carro não pega e o jeito é descer todo mundo para empurrar correndo (e vestidos de mulher) ladeira abaixo. Chegando no declive o plano dá errado e Wanderley perde o freio e o controle do carro que está prestes a cair no canal da Ponte do Galo. Os seguranças da boate atirando enquanto o carro de Bocage e Aguinaldo, levando as meninas, diminui a velocidade para que o padre e o delegado entrem pela janela. Wanderley se joga do carro, antes que este mergulhe das margens barrentas, salvando-se. O som do carro, que estava no máximo, ainda tocava os últimos acordes do maior sucesso do Alice in Chains.
Dentro do outro carro, enquanto dirige, Aguinaldo pergunta preocupado, para o delegado:
- Pra onde, Chefe?
- No, no. Só tem um lugar pra levar essa santa: para a igreja das Novenas. Não se preocupe com os outros. Eles chegam até lá de alguma forma e antes do final do jogo.
Bocage ainda teve cabeça para organizar uma porrinha com o whisky roubado e embebedar de vez as meninas. Ivone e Marta já estavam na quinta rodada.
O grupo se divide ao atravessar a ponte: Vila, Castro, Aloísio, Wanderley, Sávio e a garota tem que atravessar, do Telégrafo até a Cidade Velha a pé, destino igreja das Novenas.
Os seguranças retornam. Mas isso não vai ficar assim.
Do lado de fora da boate, num cartaz com a foto da mulher mais estupidamente gostosa que vocês puderem imaginar, estava escrito:

DESSE NAIPE VOCÊ SÓ PEGA AQUI!

CONTINUA...

Transmissível Nº 02 (de Marcos Salvatore)


Eu posso estar
A mil quilômetros daqui
Mas eu sei que já andei demais
Você pode até duvidar.

Talvez por medo,
Talvez por nada,
É só questão de tempo.
Pra gente ser feliz

E o que é que temos a ver com isso?
Se o que vale é estarmos juntos?
Se o que importa é acreditarmos nisto?
E eu já não caibo mais no mesmo lugar.

O tempo conosco
Se estiver conosco
E a chuva lá fora
Se quisermos rir, sem nos ferir.

Obra do acaso, sim.
Transmissível pra você e pra mim.

CERCO (Por Milton Meira)

O cerco é um linha tênue
Olhar que sangra...
Imagem posta em silêncio,
o corpo morre.

Por Milton Meira

TEMPORALIDADE - Por Milton Meira

Meu tempo é rumo

Sumo

Em uma sombra

De eras.


PARA ACESSAR OS BELOS POEMAS DE MILTON MEIRA:

MILTONAUGUSTOMEIRA.BLOGSPOT.COM

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Tchello D'Barros


 Tchello d'Barros é catarinense de nascimento (Brunópolis-SC), nordestino por opção (sediado em Maceió-AL), e cidadão do mundo por vocação (com deambulações por 20 países), exercendo-se nas lides da Literatura e das Artes Visuais. Depois de 5 livros de poesia experimental publicados e mais de 10 individuais de desenhos, fotografias, pintura, infogravuras, instalação, vídeo, site-especific, performances e manifestos, o designer hoje atua ainda como produtor cultural e editor independente.


EFEMEROETERNO


PRECONCEITO


A TEIA


Algumas produções recentes vc pode conferir nos blogs: Poesia http://www.tchellodbarros-poemas.blogspot.com/ Poesia de Cordel http://www.tchellodbarros-cordeis.blogspot.com/ Contos e Crônicas http://www.tchellodbarros-contosecronicas.blogspot.com/ Literatura Infantil http://www.tchellodbarros-literaturainfantil.blogspot.com/ Artes Visuais http://www.tchellodbarros-artesvisuais.blogspot.com/ Poesia Visual http://www.tchellodbarros-fotografia.blogspot.com/ Relatos de Viagens http://www.tchellodbarros-viagens.blogspot.com/ Poesia Visual http://www.tchellodbarros-poesiavisual.blogspot.com/ Obs.: A obra visual e literária de Tchello d'Barros está registrada e é protegida pela lei do direito autoral.


www.tchello.art.br tchello@tchello.art.br

sábado, 20 de agosto de 2011

20 Motivos Para Não Ser Cristão (Por Bosco Silva)



RESUMO: Este artigo parte da ideia de que tudo pode, e deve, ser questionado, pertencendo mesmo à própria essência da razão e da liberdade humana, o ato de questionar, contrariando, portanto, a ideia de que fatos religiosos, por serem tidos como “sagrados”, não devam ser questionados.

Abaixo, alguns motivos que me levaram a não ser cristão, tomados de alguns aspectos do Cristianismo: desde fatos históricos antigos, e fatos do presente, à ética e moral cristã.

São vinte os motivos (apenas para impor um limite), mas poderiam ser muito mais...

1. O CRISTIANISMO TRANSFORMA O QUE É DEFEITO EM FALSA VIRTUDE

O que você acharia de alguém que dissesse sentir prazer em lamber feridas de leprosos. Ou ainda: de não ter comido nada tão delicioso quanto o pus dos seios de uma cancerosa?

Antes de você esboçar uma resposta, e chamar de loucas tais pessoas, saiba que estas palavras foram pronunciadas por pessoas que são tidas, ainda hoje, como modelos de virtude e de bem viver, foram palavras proferidas pelos Santos católicos São João da Cruz (1542 – 1591) e Catarina de Siena (1347 – 1380), respectivamente; bem como Santa Marguerite-Marie Alacoque (1647-1690), que transformava vômito e fezes de doentes em alimento; certa vez afirmou que o contato bucal com as fezes de doentes suscitava visões de Cristo, como se estivesse com a boca colada em suas chagas.

Como podemos ver pelos exemplos dados, o que é tido muitas vezes como um distúrbio psicológico, quando fora da religião, pode ser cultuado como virtude quando visto pelos olhos da fé. E o que é meramente um ato de masoquismo, passa a ser visto como um ato supremo de dedicação aos pobres, de caridade e humildade. Transformando distúrbios psicológicos em virtudes cristãs.

Este texto tem o intuito de demonstrar que o Cristianismo, assim como todas as religiões, tem o grande poder de transformar o que é defeito (quando visto fora da religião), por meio da ideia de bondade, sacrifício, etc., em falsa qualidade.

DA JUSTIÇA CRISTÃ

2. Para a igreja o aborto é mais grave que o estupro, mesmo que o estupro tenha sido feito em uma criança de 9 anos, e que a gestação acarrete prejuízo a sua saúde, podendo mesmo levá-la à morte. O que a impediria, pela idéia de justiça professada pela igreja, que a criança usufrua de meios para impedir uma gestação, não apenas desagradável, como perigosa. Como aconteceu no estado de Pernambuco, em que a igreja, através do Arcebispo de Olinda e Recife, d. José Cardoso Sobrinho, botou em prática a “BELA” idéia de justiça cristã, ao excomungar, não apenas a vítima de estupro, uma menina de 9 nove anos de idade, que fora estuprada pelo padrasto, bem como todas as pessoas que a ajudaram com o problema, como médicos e parentes, incluindo a mãe da menor, menos o estuprador, é claro. E (pasmem!) a proibição do aborto é mantida pela igreja, mesmo em casos de gestação de fetos acéfalos, ou seja, de fetos sem cérebros; mesmo que a gestação seja inviável e traga possíveis problemas, tanto físico quanto psicológico à mãe.

A penalidade religiosa máxima dada pela igreja a uma criança, estuprada desde os 6 anos de idade, no caso, a excomunhão, demonstra a contradição envolvendo tal idéia de justiça dada pela igreja, já que afim de preservar uma “vida”, não apenas põe outra em risco desnecessariamente, mas acarreta, através da excomunhão, uma penalidade ainda mais grave que a morte do corpo, mas a morte da alma, uma vez que para a igreja, tal penalidade significa que o excomungado fica impedido de receber os sacramentos da igreja, e consequentemente a salvação de um inferno com penas eternas terríveis. O que fica bem demonstrado é que, como no caso da proibição de aborto de fetos sem cérebro, a igreja ainda não se adequou aos modernos meios científicos. Pois, como sabemos, não se pode viver sem cérebro. Um feto sem cérebro (e que jamais o possuirá) não possui vida. Logo o aborto, pelo menos nesse caso, jamais poderá ser definido como a interrupção da vida. Ou será que para a igreja é possível viver SEM cérebro? Talvez este seja mesmo o ideal da igreja, já que para se aceitar uma noção de justiça tão idiota como essa não se necessita mesmo de muito cérebro.

3. Você acharia justo que filhos, netos e bisnetos, de alguém que praticou um mal no passado, viessem pagar, sem terem cometido o mesmo mal, pelos crimes feitos por um antepassado? Não? Pois essa é a pena dada pela “JUSTIÇA” do Deus cristão aos humanos. Pelo erro cometido por Adão e Eva - segundo o Cristianismo nossos primeiros antepassados – pagamos com sofrimentos, ainda hoje, como a velhice, dores do parto, com o trabalho, a morte, etc. Essa forma de justiça se baseia em uma antiga, primitiva, ultrapassada, injusta e violenta forma de justiça judaica, que originou o termo “Bode Expiatório”, e que gerou o Cristianismo, em que ao sacrificarem um animal à Deus, os homens faziam as pazes com a divindade, por erros cometidos. E essa mesma noção de justiça, transparece no sacrifício de Cristo, em que este se sacrifica e toma para si as consequencias dos erros de Adão, Eva e da humanidade. Por isso ele é chamado de cordeiro de Deus: aquele que é dado em sacrifício ao Deus cristão.

Mais um belo exemplo de justiça cristã, em que as conseqüências e o castigo de outros são transferidos para alguém ou para um animal inocente.

4. É dito no livro bíblico do Gênesis, que enquanto Moisés, no monte Sinai, recebia os dez mandamentos de Deus, incluindo o sábio mandamento “NÃO MATARAS”, seu povo passou a cultuar outro deus, e a se entregar a mais extrema anarquia. E que quando este desceu trazendo as novas regras de vida ao seu povo (incluindo o famoso: NÃO MATARÁS), ao ter visto tal cena, ordenou que todos os que tinham se entregado a tal ato, fossem imediatamente mortos, menos os que continuavam fiéis a sua crença.

Outro belo exemplo bíblico de contradição e de justiça cristã. Então seria dado o direito de matar apenas aos intérpretes de Deus? É um bom argumento para justificar as milhares de mortes dos que desobedeceram a igreja durante a Inquisição. Vocês não acham?

5. Com todo esse ideal de justiça cristã, não é de estranhar que o grande defensor católico Orlando Fedeli, desse belas amostras de sabedoria e de justiça cristã ao afirmar, com base em São Tomás de Aquino, o grande filósofo cristão, e o mais influente pensador da igreja: “a pena de morte é sempre um ato de AMOR pela alma do condenado, porque, se ele se arrepende, já pagou na terra o seu crime; e, se não se arrepende, sofrerá menos no inferno, pois viveu menos tempo em pecado.”

Sem dúvida, uma bela amostra de compaixão cristã!!! Não é mesmo?

A BÍBLIA NÃO É UM LIVRO DE INSPIRAÇÃO DIVINA

6. Primeiro: é surpreendente que um ser extremamente poderoso e inteligente, como é definido o Deus cristão, possa ter escolhido um meio tão vulnerável, tão fácil de ser distorcido e interpolado quanto um livro, para espalhar suas idéias, principalmente naquelas épocas. E pode-se questionar, por isso mesmo, a autoridade da Bíblia devido às interpolações contidas nela - ato que parece ter sido bastante comum como comprova as palavras de um de seus próprios autores, como na advertida dada no livro Bíblico, apocalipse, versículo 18: “Se alguém fizer acréscimos às páginas deste livro, Deus o castigará com as pragas descritas aqui”.

7. Dizem que a Bíblia é um livro sagrado, ditado pelo próprio Deus, que contém apenas sabedorias e verdades. Se é assim, então por que existe, nela, tantos erros humanos?

No Gênesis – primeiro livro bíblico – está escrito que no primeiro dia da criação Deus fez a luz (Disse Deus: Haja luz; e houve luz. Gênesis 1:3). Porém apenas no quarto dia da criação, Deus cria as estrelas, incluindo o sol. Isso deveu-se a um erro humano de conhecimento, ou Deus errou e deu uma consertadinha depois?

8. Outro erro astronômico está em Josué 10:12 (Então, Josué falou ao SENHOR, no dia em que o SENHOR entregou os amorreus nas mãos dos filhos de Israel; e disse na presença dos israelitas: Sol, detém-te em Gibeão, e tu, lua, no vale de Aijalom.)

Na estória, Josué precisa que o dia se prolongue, por isso dá este comando ao sol: “SOL, DETÉM-TE EM GIBEÃO”. E assim, ao parar o sol, o dia se prolongaria indefinidamente. Outro erro antigo, pois achava-se, antigamente, que o sol girasse ao redor da Terra, e assim, criasse o dia. Mas obedecendo ao conhecimento, de hoje, Josué teria que dizer: TERRA, DETEM-TE, já que é a Terra que gira ao redor do sol. Este versículo bíblico foi um dos responsáveis, pela tortura, condenação e morte, na fogueira, do filósofo Giordano Bruno, por este descordar de tal afirmativa. E do quase fim semelhante do famoso astrônomo e físico Galileu Galilei, por também discordar da igreja.

9. Aquele que acredita que a Bíblia é um livro da mais pura bondade está errado. Ela está impregnada também por muita maldade. Alguns exemplos:

Em Deuteronômio 22:22-23: “Caso um homem seja encontrado deitado com uma mulher que não tenha dono, ambos têm que morrer juntos…” E continua: “…tendes que levá-los para fora do portão daquela cidade e tendes de matá-los a pedradas, e eles têm que morrer”. Um costume que continua ainda hoje, nas pacíficas e tolerantes terras das Arábias, em que a mulher adúltera é enterrada e apedrejada apenas com a cabeça de fora. E ao homem é dado o privilegio de ser enterrado com as mão de fora, para que possa defender-se das pedras.

Em II Crônicas 15:13, sentencia: “…todo aquele que não procurar por Jeová, o Deus de Israel, seja jovem ou velho, homem ou mulher, deverá ser morto”. Em Êxodo 22:20, demonstra sua absoluta intolerância: “Quem oferecer sacrifícios a quaisquer deuses, e não somente a Jeová, deverá ser completamente destruído”. Um bom exemplo da bondade do Deus cristão. Não é mesmo?

E não pensem que é apenas o Velho Testamento:

Como diz o bom Jesus em Mateus 10:34, em um momento de furor: “Não penseis que vim estabelecer paz na terra; vim estabelecer, não a paz mas a espada. Pois vim causar divisão; o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe. Deveras, os inimigos do homem serão pessoas de sua própria família. Quem tiver maior afeição pelo pai ou pela mãe maior que por mim, não é digno de mim; e quem tiver maior afeição pelo filho ou pela filha que por mim não é digno de mim”.

E há ainda muito, muito mais. É só procurar...

E falando em Jesus, temos:

DE JESUS

10. A BIOGRAFIA DE JESUS CRISTO FOI INVENTADA:

Hoje, graças ao decrescente poder da igreja e aos modernos meios de comunicação, que facilitam muito a divulgação de informações independente dos meios ainda dominados pela igreja, cresce a idéia de que a “história” de Jesus Cristo é apenas uma coletânea de partes tomadas de estórias de deuses de outras religiões, tomados de empréstimo para compor a história de Jesus de Nazaré; “(...) reunindo traços tomados dos mitos de ÁTIS da Frígia, DIONÍSIO da Grécia, BUDA do Nepal, KRISHNA da Índia, OSÍRIS e seu filho HÓRUS do Egito, ZOROASTRO e MITRA da Pérsia e toda uma série de deuses e redentores do gênero humano que o precederam em séculos, e ainda em milênios (...)”. Exemplos:

“ÁTIS morreu pela salvação da humanidade, crucificado em uma árvore, desceu ao submundo e ressuscitou no terceiro dia. MITRA teve doze discípulos; pronunciou um Sermão da Montanha, foi chamado de Bom Pastor, se sacrificou pela paz do mundo e ressuscitou aos três dias. BUDA ensinou no templo aos 12 anos, curou enfermos, caminhou sobre a água e alimentou quinhentos homens com uma cesta de biscoitos; seus seguidores faziam votos de pobreza e renunciavam ao mundo; foi chamado de Senhor, Mestre, a Luz do Mundo, Deus dos Deuses, Altíssimo… KRISHNA foi filho de um carpinteiro, seu nascimento foi anunciado por uma estrela no oriente e esperado por pastores que lhe presentearam com especiarias…”

Fato é que, independente de ser verdadeiro ou não, a semelhança entre a história de Jesus e de outros deuses, é simplesmente incrível. E acrescenta-se a isso a hipótese: se a intenção era tornar o personagem Jesus Cristo universal (católico, em grego), a melhor forma seria que este possuísse características de outros deuses, afim de torná-lo familiar à outros povos. Não é mesmo? E assim facilitar sua aceitação. O que deve ter sido útil também ao misturar a estas estórias, antigas profecias judaicas.

Contudo, muitos, ainda hoje, argumentam ser a Bíblia a maior prova da existência de Cristo. Estes argumentam que Cristo cumpriu mais de trezentas profecias sobre sua vida; muitas delas com centenas de anos anteriores a sua vinda à Terra. Calcula-se, por exemplo, que a chance de apenas oito destas profecias fosse cumpridas casualmente seria de uma em 1028 (isto é, uma em 10000000000000000000000000000). O que não se argumenta, no entanto, é que, uma boa explicação para isso seria que, a “história” de Cristo seria apenas uma criação também a partir de antigos textos bíblicos e mesmo de profecias, como falsas concretizações destas. Como, por exemplo, o detalhe da traição de Cristo por Judas, pelo valor de trinta moedas de prata, recebidas das mãos do sumo sacerdote; e seu posterior arrependimento, devolvendo-as aos pés do mesmo. Isto pode ser visto em um escrito bíblico anterior ao suposto nascimento de Cristo, o Livro de Zacarias, em que Zacarias fala do rompimento da fraternidade entre Judas e Israel: “Então o Senhor me disse: atire isso ao oleiro, esse magnífico preço em que fui avaliado por eles. Tomei as trinta moedas de prata, e as atirei ao oleiro na casa do Senhor.” (Zacarias, 11:13,14.)

Algumas dessas adaptações da suposta vida de Cristo às passagens de escritos bíblicos mais antigos, são tão forçadas que chegam a contradizer as próprias crenças do personagem Jesus Cristo; como a ocasião em que Cristo crucificado tem suas vestes disputadas por soldados romanos, por meio de apostas com jogos de dados. Esta passagem foi copiada de uma passagem do Salmo 22 (versículo 18), em que se lê: “Repartem entre si as minhas vestes, sobre a minha túnica deitam sortes.” A contradição está no fato que, se há disputa com relação às roupas de Cristo, significa que estas tinham um certo valor econômico. O que não condiz com a pobreza voluntária de Cristo.

Outra adaptação forçada é sobre a ascendência de Jesus, que segundo uma profecia do Livro bíblico de Isaías, o Messias nasceria da descendência do rei Davi. Então, faz-se pai de Jesus, José, que é um descendente longínquo do rei Davi. Até aí, tudo bem. Porém, Cristo tem que nascer de uma mulher virgem, também, para que seja isento de pecado. Conclusão: a confusão tá formada. A solução é fazer de Cristo um filho adotivo de José. Mas a profecia requeria que houvesse uma descendência carnal...

Há também a contradição com relação ao nascimento de Cristo:

Como a profecia do Livro de Miquéias (Miquéias 5, 2), afirmava que o Messias nasceria em Belém, então os escritores do Novo Testamente tiveram que também adaptar a “história” do personagem Jesus, à essa profecia:

Mateus faz logo Jesus nascer em Belém. Já Lucas faz os supostos pais de Jesus, José e Maria, irem para Belém, devido a um censo que obrigaria José ir à cidade de seus antepassados, Belém. Onde Cristo nasce. Surpreendentemente, João, não liga para essa profecia, e faz Jesus nascer em outra cidade. Seu Evangelho demonstra claramente que seus seguidores ficaram surpresos com isso, como podemos ver na passagem de seu Evangelho: "Outros diziam: Ele é o Cristo; outros, porém, perguntavam: Porventura, o Cristo virá da Galiléia? Não diz a Escritura que o Cristo vem da descendência de Davi e da aldeia de Belém, donde era Davi?" Cada autor, portanto, lida de modo diferente com tal adaptação da estória.

Assim, aprendemos que a adaptação de um personagem, como Jesus, a todas essas condições proféticas, tão diferentes, acarreta certo grau de incoerência à sua estória.

Em suma, a estória de jesus é tão verdadeira quanto a imagem atribuída hoje à ele. Uma imagem de um homem branco, de cabelos castanho-claros e olhos azuis; embora seja extremamente improvável, naquela época, a um homem de origem semita; refletindo muito mais as características físicas dos pintores europeus que a criaram.

11. NÃO TEMOS COMO PROVAR QUE CRISTO EXISTIU

Torna-se um problema saber se Cristo existiu. Muitos historiadores se espantam ao constatar que um personagem tendo feito tantos fatos maravilhosos não tenha deixado pegadas suas na história. Nenhum historiador moderno registrou qualquer evidência de sua existência. O que deve ter perturbado muitos cristãos daquela época, levado-os a falsificar muitas obras (e nunca é de mais lembrar que, não tendo sido ainda inventada a imprensa, tais obras eram copiadas à mão por monges cristãos, afim de preservá-las), como a do historiador judeu Flávio Josefo, que escreveu sobre os acontecimentos da época que Cristo teria vivido. E que supostamente afirmaria nas Antiguidades Judaicas: “Agora havia acerca deste tempo Jesus, homem sábio, se é que é lícito chamá-lo homem. Pois ele foi quem operou maravilhas... Ele era o Cristo... ele surgiu a eles vivo novamente no terceiro dia, como haviam dito os divinos profetas e dez mil outras coisas maravilhosas a seu respeito.” O que se questiona, aqui, como bem viu Voltaire, é que de toda uma volumosa obra apenas algumas linhas são dedicadas a Jesus, um personagem que pela quantidade de maravilhas que efetuou faria com que qualquer historiador, não-cristão, escrevesse livros e mais livros sobre ele, no entanto, Josefo, supostamente, dedicou à ele apenas algumas insípidas linhas. E mais: depois deste pequeno trecho dedicado a Cristo, Josefo passa a expor assunto totalmente diferente, discorrendo sobre os castigos impostos ao povo humilde de Jerusalém. Demonstrando ser o texto, por si próprio, uma grosseira interpolação feita por algum apaixonado adepto cristão.

Três outros historiadores são citados pelos adeptos cristãos como testemunhas da existência de Cristo:

O historiador romano Tácito (55-120), ao escrever sobre o incêndio de Roma em seu Anais, capítulo XV, p. 54, citou:

“Nero acusa aqueles detestáveis por suas abominações que a multidão chama de cristãos. Esse nome vem de Cristo, que sob o principado de Tibério, foi mandado para o suplício pelo procurador Pôncio Pilatos. Reprimida momentaneamente, essa superstição horrível rebrotou novamente, não apenas na Judéia mas agora dentro de Roma”.

Já Suetônio (70-128), ao descrever a vida do imperador romano Cláudio, escreve em Vida de Cláudio, cap 25, p. 4:

“O Imperador expulsou de Roma os judeus que viraram causa permanente de desordem pela pregação de Cristo”.

E Plínio, o jovem (61-114), escrevendo para o imperador Trajano, Carta a Trajano, cap. X, p. 96, diz, o seguinte:

“Os cristãos têm o hábito de se reunir em um dia fixo para rezar ao Cristo, que consideram Deus, para cantar e jurar não cometer qualquer crime, abstendo-se de roubo, assassinato, adultério e infidelidade”.

Mais uma vez torna-se de extrema necessidade repetir a afirmação dita anteriormente:

Todos os livros e documentos, cristãos ou não-cristãos, favoráveis ou neutros à religião cristã, eram copiados à mão por sacerdotes cristãos, ao longo de toda a história antiga, afim de preservá-los e fazer com que estes não desaparecessem. Os que eram desfavoráveis à religião cristã foram imediatamente destruídos, como o livro Discurso Verdadeiro do filósofo pagão Celso, que atacou a doutrina cristã no ano 178. Celso, conhecendo um boato antigo sobre Jesus, dizia que Cristo era o fruto do relacionamento de uma judia, Maria, com um soldado romano de nome Panthera. Tal fato só chegou ao nosso conhecimento porque foi citado e negado pelo escritor cristão Orígines em seu livro - este sim amplamente reproduzido - intitulado Contra Celsum. Ato que por si só torna-se não confiável qualquer documento, que tenha sido copiado e preservado pela igreja que porventura ateste a existência de Cristo. Tal ato tornou-se tão arraigado à igreja que somente em 1968, o índex livrorum proibitorum, um serviço da igreja que classificava todos os livros contrários à crença católica, e que proibia a leitura de tais livros em estabelecimentos da igreja, ou, de modo geral, por católicos, fora desativado.

DA HISTÓRIA CRISTÃ

12. Com a descoberta, em 1945, dos chamados Evangelhos apócrifos, ou seja, de Evangelhos não aceitos pela igreja, tivemos definitivamente a prova de que existiram várias versões diferentes de Cristianismo. Isso é patente mesma na Bíblia atual, pois vemos na carta aos Gálatas, um dos documentos cristão, aceitos, mais antigo, podemos acompanhar uma discussão entre os apóstolos Paulo e Pedro: "Mas quando Pedro chegou a Antióquia, eu me opus abertamente a ele, pois é evidente que estava errado.” (Gálatas 2:11) ...“Se você [Pedro], que é judeu, vive como os pagãos, e não à maneira dos judeus, como pode obrigar os pagãos a viver à maneira dos judeus?” (Gálatas 2: 14).

Essa discussão deveu-se ao fato de que Pedro tinha uma concepção de Cristianismo diferente de Paulo. E podemos dizer que a versão vencedora, pelo fato de ser a mais conveniente com a política do imperador Constantino, foi a de Paulo; para tanto, basta apenas perceber que dos 27 livros aceitos que compõem o Novo Testamento, 13 são aceitos como de autoria de Paulo. Isto é, quase a metade.

Seria então a versão de Paulo, de um apóstolo que jamais conheceu pessoalmente Cristo, e que não pertencia ao seu grupo de discípulos, a mais verdadeira?

13. A religião cristã, assim como suas irmãs o Judaísmo e o Islamismo, sempre foi uma religião machista; desde suas origens; alimentado pelo mito da expulsão de adão do paraíso, por intermédio de Eva, sempre viu na mulher um ser inferior; e que ainda foi mais reforçada pela versão de Cristianismo de Paulo, como podemos ver em alguns de seus escritos:

"A mulher aprenda em silêncio com toda a submissão. Pois não permito que a mulher ensine nem tenha domínio sobre o homem, mas que esteja em silêncio. Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão;[...]." Epístola a Timóteo (2, 11-15).

"Como em todas as comunidades de fiéis, que as mulheres se calem nas assembléias, pois não lhes é permitido falar; que estejam submissas, como diz a lei. Se quiserem aprender algo, que perguntem em casa, a seus maridos, pois não convém a uma mulher falar na assembléia." (Primeira Epístola aos Coríntios, 14:34-35).

E ainda hoje as mulheres sentem este preconceito, já que ainda é dada à elas apenas tarefas secundárias na igreja. Este preconceito está até mesmo na definição do sexo feminino, já que a palavra feminino originou-se da contração das palavras: “fé” e “minus”, ou seja, fé menos.

Portanto, eu não posso aceitar uma religião que inferioriza e discrimina seres tão importantes quanto as mulheres.

14. O Cristianismo é tão machista que até mesmo sua concepção de Deus é de um Deus macho, mesmo que este não faça nem tenha sexo. E assim é, volta e meia, denominado por termos masculinos: Ele, Pai, e etc.

DA MORAL CRISTÃ

15. Para a religião cristã, como já foi visto, herdamos de Adão os castigos por sua insolência à Deus, ao nascermos. Por isso não é de surpreender que o Cristianismo odeie tanto o sexo, já que é por meio deste que nascemos e herdamos tais pecados. O que levou, por sua vez, que autores cristãos fizessem Jesus nascer de uma mulher virgem, e muitos cristãos a cultuarem, ainda hoje, a virgindade de Maria. Ou a muitas mulheres a ostentar com orgulho o fruto de seu ventre, e envergolhar-se da origem deste. Esta moral de horror ao sexo passa a ver o sexo como algo degradante, e assim tolhendo e denegrindo algo que em nós é natural, gerando uma oposição à nossa própria natureza. O que, certamente, não tem gerado bons efeitos, tendo produzido (pasmem!) até mesmo perseguições e a classificação de formas de coito permissíveis pela igreja católica. Às formas de coito não consideradas dignas do homem, por exemplo, deram o nome “coitus more canino”, isto é, coito ao modo dos cães, as formas de relação sexual em que lembra os animais, de quatro. E aos que desobedeciam tal regra, quando delatados, eram castigados até mesmo com a morte. Porém, sendo algo natural, instintivo, nenhuma proibição, ou, sentimento de culpa, iria extinguir o sexo, mas tão somente intensificá-lo e distorcê-lo, pois sabemos que tudo que é proibido é mais praticado, gerando neuroses, ou distúrbios, como os múltiplos casos de pedofilia que têm assolado hoje, e certamente, sempre, as instituições católicas, praticados por seus sacerdotes celibatários. E onde há culpa, há também castigo; gerando auto-flagelação, cujo o nome técnico dado pela igreja católica é mortificação. Dando origem a várias formas de auto-flagelação, como cintas com pontas, clausura, chicotes, etc., usados por seus sacerdotes, todos meios de aplacar os instintos naturais, vistos pela igreja como tentações demoníacas. Não admira que as igrejas estejam abarrotadas de pessoas obcecadas com os sentimentos de culpa, já que aprendem desde que nascem a identificarem em todas as coisas naturais expressões de pensamentos pecaminosos. O que tem também originado na postura incorreta da igreja de proibir métodos de redução da natalidade, e até mesmo de proibir o uso de preservativo, como meio de evitar a AIDS.

Portanto, não posso aceitar uma religião que vê algo que é natural e tão necessário em nós, como os nossos instintos, como a causa de nossa miséria.

16. É dito, na moral cristã, que deve-se tratar o outro como a si próprio. Hoje, nós sabemos que isso não é bem verdade. Pois deveríamos permitir que um irrecuperável maníaco, assassino em série, vivesse em plena liberdade, como nós? Ou deveríamos manter--nos presos juntos com eles. E assim mantermos a moral cristã intacta?

DO DEUS CRISTÃO

17. A religião cristã, assim como o Judaísmo e o Islamismo, é uma religião monoteísta, isto é, crê apena em um único Deus. Isto leva inevitavelmente muitos a acreditarem que assim como há somente um Deus, há uma única verdade e, por isso mesmo, um único modo correto de se viver. O que faz com que muitos religiosos não respeitem a opinião e o modo diferentes de viver de pessoas com idéias e crenças diferentes deles, achando sempre que os que pensam diferentes são pessoas infelizes ou erradas. O que tem gerado, não apenas muita intolerância e discussão, mas muitas guerras.

Portanto, não posso aceitar idéias que estimulam a intolerância e a discriminação, como a idéia de religião.

DO CRISTIANISMO COMO RELIGIÃO

18. Como qualquer adepto de qualquer religião, a grande maioria das pessoas tornam-se cristão apenas por hábito. Isso se dá da mesma forma que falamos português:

Por que falamos português? Porque nossos pais falavam português; porque nossos avós falavam português; porque nossos bisavôs falavam português; e assim continuamente... Até chegarmos ao fato de falarmos português por termos nascido em um país colonizado por portugueses. Da mesma forma se dá com a religião cristã. E assim como falamos português, não por esta língua ser verdadeira e ser mais importante do que outras línguas, mas porque não nos deram outra opção; somos cristãos, do mesmo modo, apenas por tradição e hábito, independente do Cristianismo ser verdadeiro ou ser a mais importante das religiões.

Portanto, não posso acreditar que uma religião é verdadeira apenas por não se ter tido outra opção em que acreditar.

19. As religiões têm como base a emoção, principalmente o medo. E o que o homem mais teme, tanto hoje quanto sempre? O medo da morte. Por isso todas as religiões tentam minimizar tal medo, mesmo aquelas que geraram “suicídio” coletivo de seus adeptos. Por isso muitos estão prontos a abraçar qualquer crença que lhes dê certo conforto emocional, que lhes possa amenizar o medo da morte, do desconhecido, da solidão, da total falta de sentido da vida, ou da morte de entes queridos, sem ter a mínima preocupação em saber se é verdadeira, pois o que lhes interessa em primeiro lugar é o conforto obtido. Tanto que muitas vezes estes reagem com VIOLÊNCIA àqueles que lhes tentam alertar sobre o perigo de sua falta de critério de verdade, como se quisessem manter-se, por livre e espontânea vontade, em tal erro, ou evitarem demonstrarem a fragilidade de tal crença. O que explica bem porque muitos, embora tendo um privilegiado intelecto, e bastante conhecimento, possuem superstições religiosas.

Porém, não posso acreditar em uma religião, como o Cristianismo, apenas porque esta me dá certo conforto espiritual.

DA CONCEPÇÃO DE LIBERDADE PARA O CRISTIANISMO

20. O Cristianismo acredita plenamente na liberdade humana de escolha, no livre arbítrio, mas todo aquele que optar por outra forma de crença, diferente da concepção cristã, será excomungado, e condenado aos piores castigos no inferno.

Uma bela concepção de liberdade, não é mesmo?, já que todos são livre desde que sigamos sempre o que nos é unicamente ditado pela igreja.